Com encerramento do prazo de adaptação dos FIDC à Resolução CVM nº 175/22, gestores devem se adequar às novas regras
Além de conferir novas atribuições aos gestores de fundos de investimento, a Resolução CVM nº 175/22 equiparou-os aos administradores em termos de responsabilidade e relevância, cada um em sua esfera de atuação. A nova norma consagrou o protagonismo do gestor na estruturação e funcionamento dos fundos de investimento, conferindo a ele e ao administrador, conjuntamente, o papel de “prestadores de serviços essenciais” e segregando de forma mais clara as atribuições e responsabilidades de cada um.
Com o prazo de adaptação dos fundos de investimento em direitos creditórios (FIDC) à Resolução CVM nº 175/22 se encerrando em 29 de novembro de 2024, é essencial que os gestores de FIDC estejam preparados para essa nova dinâmica. Nesse cenário, a adoção pelos gestores de controles e processos internos sólidos e consistentes nunca foi tão crucial.
Na sistemática anterior à Resolução CVM nº 175/22, os administradores podiam ser responsabilizados, até certo ponto, pelas atividades de gestão: até então, o gestor era um dos diversos prestadores de serviços contratados em nome do fundo pelo administrador, cabendo a ele o acompanhamento e a fiscalização dos serviços prestados. Como resultado, não era incomum que os administradores estendessem alguns de seus procedimentos e exigências internas aos gestores, principalmente àqueles com estruturas mais enxutas. Esse fato, contudo, pode ter incentivado gestores a agirem de forma menos ativa quanto ao cumprimento de algumas de suas obrigações, fazendo com que a produção de elementos essenciais à comprovação da observância de seus deveres – principalmente os mais abstratos, como diligência e lealdade – ocorresse fundamentalmente no contexto das provocações do administrador.
Sob o modelo da nova regra, entretanto, essas interações dos administradores em relação a atividades do gestor devem, em grande medida, diminuir. É essencial, portanto, que os gestores, no limite das suas atribuições, garantam que seus próprios mecanismos internos bastem para assegurar o pleno atendimento às novas normas.
Além disso, a nova norma impôs aos gestores de FIDC novas atribuições e obrigações. Certos deveres são inovações por ampliarem o escopo de atuação dos gestores, enquanto outros trazem novidades em termos de detalhamento e especificidade, derivando de obrigações já existentes.
Dentre as principais atribuições dos gestores de FIDC, trazidas pela Resolução CVM nº 175/22, que representam uma ampliação de seu escopo de atuação, vale mencionar: (i) o dever de realizar a verificação do atendimento dos direitos creditórios aos critérios de elegibilidade contidos no regulamento; (ii) a responsabilidade por verificar a existência, integridade e titularidade do lastro dos direitos creditórios quando de sua aquisição; e (iii) a responsabilidade por registrar junto a entidade registradora autorizada os direitos creditórios integrantes da carteira do FIDC que sejam passíveis de registro. Ademais, a contratação de determinados prestadores de serviços – como distribuidores, consultorias especializadas e agentes de cobrança – passou a ser atribuição do gestor, o qual também assume a responsabilidade pela diligência em sua seleção e fiscalização.
Quanto às novas atribuições específicas, derivadas de obrigações anteriormente existentes, cita-se: (i) a obrigação de avaliar a aderência do risco de performance dos direitos creditórios à política de investimento; (ii) o dever de verificar a possibilidade de ineficácia da cessão em razão de riscos fiscais dos direitos creditórios de maior representatividade; e (iii) a obrigação de firmar em nome da classe os documentos relacionados à aquisição de ativos, bem como de enviar ao administrador, em até 5 dias úteis após sua assinatura, uma cópia de cada documento firmado. Caso a classe do FIDC invista em precatórios federais e seja destinada a investidores qualificados ou em geral, o gestor também deverá se certificar da inexistência de impugnações e obter documentos adicionais antes de adquiri-los.
Ainda que a Resolução CVM nº 175/22 tenha trazido inúmeras outras inovações, que vêm transformando o funcionamento dos fundos de investimento e a dinâmica desse mercado, a mudança estrutural da divisão de responsabilidade entre administradores e gestores é, sem dúvida, uma das mais relevantes. Neste cenário, além de conhecer suas novas atribuições e deveres, é fundamental que os gestores revisem seus controles e processos internos para garantir que estejam aptos ao seu cumprimento.
Por Claudia Pinheiro, Victória Baruselli e Juliana Soares